Papiloscopia

Breve resumo da história da papiloscopia.

A papiloscopia é a ciência da criminalística que identifica os seres humanos por meio das impressões papilares formadas pelas papilas dérmicas existentes nas extremidades dos dedos (dactiloscopia), palma das mãos (quiroscopia) e plantas dos pés (podoscopia) (GIRELLI, 2019). A palavra papiloscopia é um hibridismo greco-latino no qual Papilla significa papilas e Scopein examinar (BARNES, 2011). As papilas dérmicas são formadas através das cristas papilares, pequenas elevações da pele, e dos sulcos interpapilares, depressões que intercalam as cristas, formadas ainda no período de gestação e permanecem sem alterações durante toda a vida, até a completa putrefação cadavérica. As impressões digitais formam desenhos com padrões que originam os fundamentos científicos para a identificação: variabilidade, perenidade, imutabilidade e universalidade (BARROS, 2013; SENNA, 2014).

Os métodos utilizados para a identificação ao longo da história da humanidade foram muitos (nominal, ferrete, mutilação, tatuagem, fotográfico, antropométrico, craniográfico, odontolegal, papiloscópico, DNA, íris, voz) e vêm evoluindo cada vez mais (SOBRINHO, 2003; ARAÚJO, 2000; RESENDE, 2013). Entretanto atualmente, somente três técnicas são reconhecidas cientificamente como métodos de identificação e individualização humana: a papiloscopia, a odontologia legal e o DNA. A identificação humana por meio de impressões papilares oferece uma série de vantagens em relação às outras técnicas, justificando seu uso preponderantemente em um vasto campo de aplicações. Dentre os seus benefícios, podemos citar a simplicidade, rapidez, baixo custo, confiabilidade dos resultados, método de coleta não invasivo, possibilidade de arquivamento, classificabilidade e praticidade (BARNES, 2011; ROSA, 2016).

Os primeiros registros do uso de impressões papilares pelo homem para fins de identificação são provenientes da China, no período da Dinastia Qin (221 a 206 a.C.) (XIANG-XIN; CHUN-GE, 1988). Diversos outros casos sucederam mas até então não havia uma base científica sólida que suplantasse a utilização das impressões papilares como forma de identificação humana (ASHBAUGH, 1999). O desenvolvimento científico da Papiloscopia se deu a partir do século XIX, sendo influenciado pelas contribuições de diversos autores, alguns dos quais destacamos a seguir: Johannes Evangelista Purkinge (1787-1869) classificou os padrões de impressões digitais em nove categorias, atribuindo-lhes nomes (BARNES, 2011). Willian James Herschel (1833-1917) é geralmente apontado como o primeiro a ter estudado a persistência das cristas de fricção da pele (BARNES, 2011). Thomas Taylor (1820-1910) propôs a ideia de se utilizar impressões ensanguentadas encontradas em locais de crime como forma de identificar suspeitos (ASHBAUGH, 1999). Henry Faulds (1843-1930) foi a primeira pessoa a publicar em um jornal o valor das cristas de fricção da pele para fins de individualização, especialmente seu uso como evidência (BARNES, 2011; HUTCHINS, 2011). Francis Galton (1822-1911) foi o autor do primeiro livro sobre impressões digitais (BARNES, 2011), no qual estabeleceu que as impressões digitais são únicas e persistentes (GALTON, 1982). Juan Vucetich Kovacevich (1858-1925) desenvolveu um sistema de classificação de impressões digitais de ampla aceitação mundial (HENRY, 1900; BARNES, 2011).

No Brasil, José Félix Alves Pacheco foi o fundador e primeiro diretor do Gabinete de Identificação e Estatística da Polícia do Distrito Federal, introduzindo o sistema Dactiloscópico em 1902, com a implantação de um decreto que dispunha sobre a identificação de delinquentes conforme o método instituído por Juan Vucetich, considerando-se, para todos os efeitos, a impressão digital como prova mais concludente e positiva da identidade do indivíduo (ROSA, 2016). Após o uso inicial da papiloscopia na área criminal, outras áreas abarcaram esse processo, passando a ser utilizado também na necropapiloscopia (identificação de cadáveres) e na identificação civil (MARTINS & FILHO, 2019). A partir daí, este método de identificação humana passou a ser largamente utilizado no país (ROSA, 2016).

Em Goiás, o registro mais antigo encontrado acerca da legislação papiloscópica data de 1911, com a publicação do Regulamento das Cadeias Públicas, que previa a identificação dos indivíduos presos. Conforme livro do acervo do Instituto de Identificação de Goiás no ano de 1919, foi expedida a primeira Carteira de Identidade do Estado de Goiás enquanto o primeiro registro de identificação criminal data de 1930 (ROSA, 2016). O Gabinete de Identificação foi criado em 1953 e desde então, os procedimentos de identificação civil e criminal por meio das impressões digitais foram sempre utilizados. Em 1955, a Lei nº 1088 aumentou a atribuição do Serviço de Identificação, que incluía a nova competência que era a realização de perícias. A Lei nº 6725 de 1955 organizou as atribuições de quem trabalhava no Serviço de Identificação e Perícias, criando-se três cargos dentro de uma categoria: Identificador, Classificador e Datiloscopista. Em 1977, ocorreu o primeiro concurso para o cargo de Identificador (depois em 1983, 1992, 1998 e 2003). Hoje, todos os profissionais que ocupavam esses cargos já foram promovidos a Datiloscopistas. No dia 08 de janeiro de 2004, entrou em vigor a Lei nº 14.657 que criou o cargo de Papiloscopista Policial sem enquadrar os ocupantes dos cargos antigos (Datiloscopistas) (ROSA, 2016). Desde então, possuímos dois tipos de profissionais que desenvolvem os serviços papiloscópicos em Goiás: os Datiloscopistas e os Papiloscopistas. Foram realizados 2 (dois) concursos para o cargo de Papiloscopista em Goiás: o primeiro em 2010 e o último em 2014. Hoje a papiloscopia em Goiás é responsável pelas perícias de identificação humana que incluem a identificação civil, a identificação criminal, os exames papiloscópicos em locais de crime e laboratório, os exames de identificação através da representação facial humana (retrato falado, prosopografia, reconstrução facial humana, projeção de envelhecimento e disfarces), a necropapiloscopia e a busca ativa por indivíduos desaparecidos (BRASIL, 2013; BARROS, 2019; SILVA & BORJA, 2020).

A Papiloscopia está presente também na vida de todo ser humano, onde na esfera cível é comum a utilização de leitores biométricos de impressões digitais em academias, terminais de autoatendimento bancário, urnas eletrônicas, aparelhos de telefonia celular, locais de acesso restrito, etc. Impressões digitais são também tradicionalmente utilizadas por Institutos de Identificação e demais órgãos emissores de documentos de identidade válidos (BRASIL, 2009), relacionando de forma segura o documento emitido ao seu titular. Ainda na área cível, a Papiloscopia é bastante utilizada na identificação de cadáveres, possibilitando à família dar prosseguimento aos atos legais para sucessão e demais providências de cunho afetivo e espiritual. Na seara criminal, a Papiloscopia é de fundamental importância, permitindo identificar autores de crimes a partir de impressões reveladas em locais de crime e objetos correlatos. Possui também grande utilidade na verificação da identidade de suspeitos presos e no levantamento de seus antecedentes criminais (RESENDE, 2013; SILVA & SILVA, 2019; SILVA & BORJA, 2020).

Ao redor do mundo, a Papiloscopia Forense é desenvolvida por profissionais conhecidos por “fingerprint experts”, ou Peritos Papiloscopistas, no Brasil. Esses profissionais são especializados na identificação humana por meio das impressões digitais (ou papilares) e, ressalvadas as diferenças organizacionais e de nomenclaturas encontradas em cada unidade federativa, são também responsáveis pela detecção e análise de impressões digitais latentes provenientes de cenas de crime, além de outras atribuições citadas anteriormente (BARNES, 2011).

Os sistemas biométricos tornaram possível a realização de pesquisa de fragmentos de impressões digitais, desde que apresentem minúcias suficientes, em bases de dados contendo milhões de padrões de impressões digitais, apresentando resultados em poucos minutos. Na década de 80, a chegada dessa tecnologia permitiu que a cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, experimentasse uma verdadeira revolução nas investigações criminais a partir da implantação de um sistema conhecido pela sigla “AFIS” (Automated Fingerprint Identification System). A inovação proporcionou um aumento de 10 vezes na elucidação de crimes baseada em fragmentos de impressões digitais recolhidos em locais de crime pesquisados contra padrões digitais no banco de dados biométricos registrados naquela cidade (ARAUJO, 2000). Aqui em Goiás estes sistemas começaram a ser utilizados no ano de 2007, com a implantação do AFIS/DPF/MJ da Polícia Federal e hoje atua com um sistema AFIS próprio, o Goiás Biométrico que abarca o banco de dados civil e criminal de todo o estado, implantado em 2017 (SILVA & BORJA, 2020).

No Brasil, bancos biométricos civis e criminais são mantidos por órgãos oficiais de identificação, os Institutos de Identificação que integram as Polícias Civis ou Técnico-Científicas nas diferentes unidades federativas e, em âmbito nacional,  Polícia Federal. Essa tecnologia tem tornado possível a elucidação de crimes sem a necessidade de apresentação de suspeitos, o que representou uma quebra de paradigma na área e reforçou a importância da Papiloscopia Forense para as investigações brasileiras (SILVA & BORJA, 2020).

Texto com adaptações.
Alex Leonardo Tosta
Bruna Daniella de Souza Silva
Thalita Rodrigues Rocha Amorim (Revisora)

Referências Bibliográficas

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  • SILVA, B.D.S; BORJA, A. Importância da perícia papiloscópica em laboratório
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